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O Velho Oeste não é um tema avesso ao mundo dos jogos eletrônicos. Uma terra sem lei onde os fracos não tem vez e manda quem saca mais rápido? Grandes sagas foram criadas em cima desse cenário e muito sangue foi derramado em seu nome.

Entretanto, o que a pequena desenvolvedora e produtora Evil Bite propõe com Depraved é usar o tema em um jogo de administração de cidade em que mostra que a vida dos pioneiros e, principalmente, dos seus prefeitos, não era um eterno bangue-bangue.

Você inicialmente conta apenas com uma carroça onde cabem doze pessoas e todo o material necessário para montar sua primeira prefeitura. É claro que as condições não são das melhores, mas uma vez escolhida a posição inicial no mapa randômico, você começa a construção do seu império imobiliário. Daí para frente você precisará se preocupar com seu faturamento de aluguel, com o problema dos sem-teto, com a higiene da cidade, com o índice de criminalidade, com a quantidade de alimento disponível (inclusive no Inverno), com cavalos morrendo de fome nas ruas, com ataque de ursos nos becos e muito, muito mais.

É noite mas o trabalho não pode parar na cidade que nunca dorme!

Apesar do jogo estar ainda em Acesso Antecipado no Steam, é surpreendente a quantidade de detalhes disponíveis e micro-interações entre esses elementos sem que você sequer esbarre em um volume grande de bugs, como seria de se esperar com tantas variáveis envolvidas ao mesmo tempo. Não que não haja bugs (e o consumo excessivo de memória é o maior deles), mas é preciso entender que o jogo não foi lançado oficialmente e tem um milhão de engrenagens rodando nos seus bastidores. Desde sua chegada até agora, foram sucessivas correções que pegaram um título à beira do injogável e o transformaram em uma experiência suave.

Suavidade é o termo certo para Depraved, ainda que o jogo seja complexo e careça de um tutorial. O que deveria ser uma curva de aprendizagem tão brutal quanto a época que retrata foi, na verdade, é bem tranquila com novos prédios e necessidades de sua população sendo liberados em um ritmo adequado. A economia do jogo talvez não agrade os mais afoitos por desafios: construindo muitas moradias, você tanto garante um fluxo contínuo de dinheiro de aluguel, como também atrai mais trabalhadores para operarem outros serviços. Construindo novas cidades, você pode focar em particularidades do terreno, criando, por exemplo, uma cidade mineradora, uma cidade dedicada à agricultura ou outra apenas com uma forte indústria madeireira. Todas esses assentamentos compartilham do mesmo administrador, do mesmo fundo monetário e ainda podem trocar recursos com caravanas.

Condomínio Mead Ranch: estamos expandindo para melhor atendê-lo!

Era uma vez no Oeste

Talvez o grande problema de Depraved seja justamente a ausência de problemas graves, de eventos catastróficos. O frio do inverno não é tão devastador quanto se imaginaria, a cólera é fácil de controlar e até mesmo a investida de bandidos é uma dor de cabeça bem suave que pode ser solucionada com pagamentos, que não pesam no bolso, ou com o tradicional tiroteio.

Em Depraved, você pode juntar homens armados para fazer justiça com as próprias mãos e erradicar a bandidagem, mas o sistema de seleção não é muito preciso. Não é possível formar um esquadrão permanente e seus pistoleiros tendem a ir fazer outra coisa da vida se você não os conduzir passo a passo até o acerto de contas. Com a câmera no seu limite de proximidade, dá para ver a troca de tiros em toda sua glória sangrenta. Ver um de seus “homens da lei” ferido, mancando e deixando uma trilha de sangue até o posto do doutor mais próximo, é um bom momento proporcionado pela incrível engenhosidade de seus desenvolvedores. É possível também que o ferido morra antes de encontrar ajuda, o que aciona o coveiro da cidade, que irá pegar o cadáver, colocar em um caixão fabricado com a madeira de seus armazéns, e sepultar a pobre alma no cemitério local. Até na morte, sua cidade pulsa de movimento.

Os caminhos mais usados acabam se tornando as ruas naturais da cidade.

O jogador também precisa se acostumar com o ritmo da vida: Depraved é um título lento. Uma única sessão, que ainda não terminei e possivelmente não terá fim, me ocupou por nove horas contadas no Steam. Seus habitantes andam muito devagar na velocidade básica e o jogo se torna tolerável apenas a partir do primeiro nível de aceleração. Mesmo assim, as construções são lentas e há pouco o que se fazer além de escolher o que e onde construir, a menos que você seja obcecado por micro-gerenciamento e tente acompanhar a vida de cada cidadão. A Evil Bite criou um título para relaxar, não para sentir a pressão e o horror de uma cidade à beira do caos, como em Frostpunk ou Banished.

Sem uma campanha ou objetivos claros, sua meta é expandir, transformar o que era mato, deserto e pradarias em terrenos urbanizados, com saloons, siderurgias, lei e ordem. Ou apenas viver de aluguel, ver o trem passar e mastigar um matinho no canto da boca.