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O dia 3 de janeiro de 2020, a primeira sexta-feira do ano, tinha tudo para ser mais uma data comum, até que todos foram surpreendidos com uma grande notícia: Qasem Soleimani, general iraniano de altíssimo prestígio, fora morto por um ataque organizado pelos Estados Unidos. As relações entre americanos e iranianos, que já não era das melhores, deteriorou-se com a iminência de um conflito armado. O que torna tudo isso mais assustador é que o Irã, uma das potências do oriente médio, é alvo de polêmicas devido ao seu programa nuclear. Não é necessário ser um jogador de Fallout para entender quais são as consequências do uso deliberado de armamentos nucleares.

A dinâmica dos conflitos entre nações mudou bastante desde o final da Segunda Guerra Mundial. Com o surgimento das bombas nucleares, os países se mostraram mais cautelosos antes de se engajarem militarmente contra seus inimigos. A guerra fria foi o perfeito exemplo de todo esse ambiente de medo mútuo, onde as duas potências da época rivalizavam por métodos alternativos. Todo arsenal militar tinha como objetivo mostrar o poderio bélico para o mundo, uma espécie de show macabro de potencial destrutivo.

Mas e se as bombas tivessem, de fato, sido disparadas durante a guerra fria? Será que a raça humana seria completamente extinta? E se houvessem sobreviventes, teriam eles aprendido com os seus antepassados sobre os perigos da guerra? Durante todos os jogos da franquia, Fallout busca explorar essa temática que envolve a relação entre o ser humano e a guerra, deixando bem claro que, no final, a guerra nunca muda.

I don’t want to set the world on fire…

As semelhanças de Fallout com a vida real terminam a partir de 1950. Os Estados Unidos, grande vencedor da Segunda Guerra Mundial, estava em sua era dourada. Percebe-se que o sonho americano está muito presente nesse universo, sendo até aumentado. Com a quantidade certa de dinheiro, era possível comprar até um robô que automatizava todas as tarefas domésticas. As facilidades eram tantas que uma pessoa comum não precisava se preocupar com nada, exceto seu próprio entretenimento.

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É claro que todas essas novidades precisavam de uma fonte energética. As reservas de combustível fóssil, assim como na vida real, estavam se esgotando, então uma solução prática e eficiente precisava ser criada. Assim surgiram as companhias de energia atômica, que eram capazes de energizar cidades inteiras. A eficácia desse método era tão grande que a produtividade da indústria americana teve um salto gigantesco em algumas décadas, onde os mercados estavam sempre lotados de produtos que satisfaziam às necessidades de um povo extremamente consumista.

Infelizmente, mesmo com todos os avanços científicos, ainda não havia energia suficiente para as bilhões de pessoas na terra. O combustível fóssil estava sendo vendido a preço de ouro, seguindo a lei da oferta e demanda. Não demorou muito até que todas as reservas de petróleo se esgotassem, gerando guerras em todas as partes do globo. A Europa, que acabara de unificar todos os países do continente em um único estado, sucumbiu internamente devido à demanda de energia – tudo isso enquanto travava uma guerra contra os países do oriente médio.

No entanto, havia um lugar na terra em que o petróleo ainda era encontrado de forma abundante: o Alasca. Com uma vastidão de recursos naturais, não era de ser estranhar que, eventualmente, isso despertaria a cobiça de nações sedentas pelo precioso diamante negro.

What is the use in buying a car if you won’t buy gasoline?

Enquanto os americanos possuíam uma grande fonte de recursos, as coisas estavam difíceis para os chineses. As reservas petrolíferas da China já haviam esgotado, causando uma enorme crise energética interna. Se não havia uma solução caseira para essa crise, a solução externa também se mostrava inviável, pois as conversas para a importação do petróleo dos Estados Unidos não foram bem sucedidas, resultando no rompimento total das relações comerciais entre as duas potências.

Um clima diplomático tenso pairou sobre o mundo. Os americanos, que guardavam seus recursos à sete chaves, previram que uma invasão chinesa poderia ocorrer a qualquer momento. Rapidamente, investimentos referentes à defesa do Alasca foram feitos, mas nada impediu a China de atacar esse território vital americano, capturando a cidade de Anchorage.

Nem mesmo o frio é capaz de deter as ambições chinesas!

Se vendo no meio do fogo cruzado, o Canadá se mostra relutante em permitir o acesso das tropas dos Estados Unidos em seu território, elevando a tensão entre canadenses e americanos. Esse cenário não se manteve por muito tempo; a América do Norte, assim como a Europa, se tornou um único país, sob o pretexto de união contra um inimigo em comum.

A China decidiu investir em tecnologia de furtividade, criando equipamentos capazes de tornar um soldado invisível no campo de batalha. A resposta americana foi grandiosa. Com grandes gênios da engenharia disponíveis, bem como o domínio da técnica de geração elétrica através de átomos, verdadeiras máquinas de guerra surgiram em seus laboratórios secretos. Assim nasceu o Liberty Prime, um robozão muito semelhante ao do filme O Gigante de Ferro, e a tecnologia que decidiu a guerra: a power armor.

Crawl out through the fallout, baby

O choque de realidade para os chineses foi brutal: não havia como lutar contra um soldado equipado com uma power armor. Combinando a resistência de um tanque, a mobilidade de uma unidade de infantaria e o poder de fogo de um esquadrão inteiro, os americanos ceifavam as vidas chinesas como um fazendeiro em época de colheita.

O modelo T-51b representou o auge da power armor.

A China até que tentou responder, desenvolvendo modelos de power armor semelhantes aos dos americanos, mas eles estavam muito atrás tecnologicamente. O território norte-americano foi liberado em pouco tempo, encerrando os conflitos no outono de 2077.

Uma sensação de paz pairava em terras americanas, porém eles mal sabiam que as pendências da guerra ainda não estavam resolvidas por parte dos chineses. Os mais paranóicos talvez tenham percebido o clima estranho, sabendo que seu rival não aceitaria uma derrota tão facilmente. Infelizmente, para o infortúnio da humanidade, eles estavam certos: a China disparou seus mísseis nucleares.

É nessa hora que a história do Fallout 4 começa. Membros do governo e da elite americana, sabendo com antecedência do cruel destino que lhes cercava, buscaram refúgio em abrigos construídos com o dinheiro daqueles que iriam sofrer os impactos diretos de suas políticas. Os cidadãos mais afortunados (e alguns escolhidos a dedo) conseguiram se manter longe dos efeitos radioativos nas chamadas “vaults”, estruturas subterrâneas imensas capazes de resistir às bombas e servir de casa para centenas de pessoas durante longos períodos.

It’s all over, but the crying…

O que aconteceu com os que foram deixados para trás? Teriam eles morrido de forma instantânea ou a radiação teria os matado lentamente? Ou talvez, por algum milagre, alguns tenham sobrevivido? Não é necessário ter jogado nenhum dos jogos da franquia para saber que os humanos conseguiram sobreviver ao holocausto nuclear; caso contrário, ao invés de um RPG, Fallout seria apenas um jogo sobre a colonização de uma terra pós-apocalíptica.

Peace Sells… but Who’s Buying?

Mas qual foi o custo de tudo isso? A humanidade finalmente aprendeu uma lição sobre os horrores da guerra? Essas são perguntas que eu deixarei sem resposta neste artigo. Talvez agora, sabendo de todo o cenário pré-guerra, as relações interpessoais desse universo façam mais sentido. Aos que já tiveram o prazer de provar o universo de Fallout, deixo o meu convite para rejogar essa franquia clássica e responder às perguntas contidas no início desse parágrafo.

Se esse jogo passou longe do seu radar durante a época de lançamento, essa é a hora de explorar toda a diversidade que os ermos podem te oferecer. A ambientação e a história fazem com que todos os jogos, até mesmo os da década de 1990, sejam relevantes até hoje.