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Quarta-feira, três e meia da tarde e um calor inclemente torrando toda minha motivação de continuar trabalhando no carro do cliente. Com isso, uma pausa é sempre bem vinda e necessária para momentos como este. No entanto, o destino é uma meretriz de mãos geladas pegando no seu pé no meio da noite e assim que abri o feed do Facebook para poder dar umas risadas, o que me veio à mente foi o mais alto desconforto. O motivo? O fato das pessoas não saberem se desligar de coisas do passado ou tentarem aproveitar a nova forma que elas retornam para o mainstream.

Já estava com isso na cabeça desde os últimos dias, afinal vi o mesmo acontecendo com a última temporada de Castlevania na Netflix, que pelo visto está muito boa. Tanto Castlevania e Horizon Zero Dawn são os atuais alvos dos manchild que não conseguem enfiar em seus crânios maciços que as coisas se transformam. Logo vamos falar sobre a atual situação ridícula: o papelão que jogadores de Playstation 4 e as viúvas de Drácula tem passado nos últimos dias.

Começando por aquele que deu o pontapé para a escrita da coluna foi o ato de muitos dos brasileiros fãs agressivos da Sony mostrando sua infantilidade. Logo depois que Horizon Zero Dawn fora anunciado para PC, já era possível se notar um certo burburinho nos grupos de fãs. Alguns elogiando a Guerrila pela ousadia e dizendo que ansiavam por outros jogadores experienciando a incrível aventura de Aloy nos PCs. Mas claro que existiam aqueles que vociferavam sua indignação contra a Sony, tal qual um padre fala de uma prostituta ou do pobre bebum maltrapilho.

Imagem da Coluna Síndrome de Manchild
Eu vou para o PC e não to nem ai!

Até aí a gente entende, uma reação exagerada, sem dúvidas. Ainda mais com a Sony sendo uma empresa japonesa, vários destes exigiriam que a alta cúpula da mesma cometessem Seppuku, a fim de restaurar a honra da empresa. Mas o verdadeiro absurdo da coisa vem com a ação em massa de pessoas indo à página da Playstation Brasil Oficial no Reclame Aqui, com o motivo absurdo de dizer que a mesma deveria reembolsá-los ou se retratar pela acusação de propaganda enganosa.

Queria muito jogar Horizon Zero Dawn, para isso FUI OBRIGADO a comprar um console que custa 3000 reais para poder jogar este jogo + mais o preço do jogo, pelo fato de haver um selo chamado “ONLY ON PLAYSTATION”, agora este mesmo jogo foi lançado para computador, o que eu possuo hoje pois sou analista de sistemas, isso é uma propaganda enganosa, COMO AINDA VENDEM HOJE NA LOJA JOGOS COM ESSE SELO? SE EU ABRIR A STORE HOJE TEM DIVERSOS JOGOS QUE ESTÃO COM ESTE SELO, ISSO É ENGANAR O CONSUMIDOR, UMA VERGONHA TOTAL PARA ESTA EMPRESA. Como posso fazer a compra de um novo jogo hoje? O computador é muito mais potente que um console, o que me faz comprar estes jogos são justamente este selo “ONLY ON PLAYSTATION”, e ainda existe um problema no brasil que por questão de impostos e tributos o preço digital no computador é muito mais barato, deixo aqui minha reclamação, não deixarei esta reclamação ser fechada até o site ser ajustado, REMOVAM O SELO ONLY ON PLAYSTATION DO SEU SITE, ISSO É ENGANAR O CONSUMIDOR.

Esta é apenas um dos vários exemplos de textos que invadiram minha tela e deixaram meu queixo no chão. Perdoem o meu francês, mas você não foi obrigado a merda nenhuma. Não é como se Jim Ryan, John Kodera e Kazuhiko Takeda tivessem enfiado o cano do revólver na sua boca e obrigado você a comprar o sistema deles. E convenhamos se você comprou um conosle por 3.000 é de duas, uma: ou você comprou uma edição de colecionador – o que prova que você já estava de olho no console a tempos -, ou você é muito tapado para pagar 3.000 em um console no final da geração para jogar apenas um título.

Imagem da Coluna Síndrome de Manchild
Representação visual dos fãs die hard, que brigam por console

Sim, concordo que existe o selo “Only for Playstation” na capa do jogo. Mas em momento algum isso quis dizer que o jogo seria exclusivo até o final dos tempos. As empresas estão acostumadas a fazer isso, a fim de trazer um jogo de volta da cova. Horizon Zero Dawn foi lançado há 3 anos, não é como se fosse algo novo, algo que tivesse acabado de ser lançado; e ainda que fosse, devemos ter noção de que, além do dinheiro, as empresas querem que o máximo de jogadores tenham acesso a aquela experiência.

Se você realmente se sente traído, furioso com isso como no caso acima e muitos outros, se sente merecedor de um pedido de desculpas ou reembolso, acredito que é hora de procurar uma ajuda emocional, por que não faz o menor sentido. É como ir em um tatuador e escolher uma arte que ELE criou, tatuar em você e meses depois ver em alguém diferente e ir exigir explicações do por que outra pessoa tem uma igual. É uma comparação ridícula para uma situação real e tão absurda quanto.

A segunda parte do texto vem da minha indignação de como a masculinidade do meio gamer é frágil. Exato, eu disse: um bando de cabra velho – ou novo – que está tão fundo no armário que tem que sair da frente para a mãe tirar as decorações de natal. Durante a terceira temporada de Castlevania da Netflix vemos que a equipe realmente se empenhou em trazer referências de jogos e do mundo real. Como Lindenfeld e Styria, além da nova dose de horror cósmico adicionado a série. Aviso de spoilers à frente, então tomem cuidado.

Imagem da Coluna Síndrome de Manchild
A terceira temporada não teve o combate marcante da segunda, mas avançou a história de forma incrivelmente significativa.

Além do desenvolvimento dos arcos de personagens como Trevor e Sypha, e como os dois sofrem uma brusca transformação moral e emocional durante a temporada. Começando a mesma como um casal de namorados que vê tudo como um filme da Disney, enquanto terminam a série com o terrível e amargo gosto da realidade humana em suas bocas. Ao mesmo tempo, Isaac cresce se mostrando cada vez mais como o antagonista que merece ser, talvez superando até mesmo sua versão de Curse of Darkness e deixando de ser um peão de Drácula. Sem contar a incrível luta do mesmo contra o boss Legião, presente na maioria dos games da série.

Tudo isso, todo este incrível trabalho de busca de referências, fanservice, escrita e animação foi jogado pela janela devido ao grande foco do nono episódio da temporada. Para aqueles que estavam apenas assistindo por assistir e para a viúvas da Konami foi apenas um episódio de sexo e porrada. Para quem realmente estava prestando atenção foi um episódio sobre a verdadeira mensagem por trás do episódio e da temporada como um todo: Traição!

Hector, sob os encantos de Lenore, acaba se unindo a vampira em um laço até maior que a carne e sangue. Enquanto nosso menino Alucard se junta ao casal de irmãos em um ménage à trois. No ápice da cena e final do episódio, Alucard e traído pelos irmãos, que após sofrerem anos nas mãos da vampira japonesa Cho, desconfiam de Alucard, já que o mesmo não revelou a eles todos os segredos do castelo – o que os deixou alarmados. Hector jura sua lealdade a Leonore que, com este voto, aprisiona o mesmo com um anel mágico, impedindo que ele fuja do castelo de Carmilla.

Imagem da Coluna Síndrome de Manchild
Se você não consegue ver uma cena vitoriana aqui, você é muito inocente.

Por fim, Isaac descobre que o capitão e o homem cego que o ajudaram durante sua jornada, não passavam de manifestações do mago de Styria, Que desejava atrair o jovem Mestre da Forja até seus domínios para assim também o escravizar. Trevor e Sypha são traídos pelos dois personagens que mais confiaram durante a temporada, Conde Saint Germain e o Juiz de Lindenfeld. Isto é apenas um episódio, em uma longa sequência de eventos que corre por outros dez episódios.

É realmente muito triste ver o backlash que uma obra como está, tão fiel ao material original dos vampiros vitorianos sendo empurrada de canto apenas porque Alucard, em determinado episódio, foi penetrado. Exatos 10 segundos foram o suficiente para que os manchild da vida estampassem o carimbo de que a obra é “lacradora”, que arruinou toda e qualquer chance deles aproveitarem o resto do seriado e das próximas temporadas.

Eu cheguei a ver os comentários mais ridículos sendo usados, indo ao nível de que Alucard seria cristão devoto, por isso não é algo canônico. Meu querido, você está ciente de que na era vitoriana, a la Bloodborne, homossexualidade por mais que “mal-vista” era normal e incentivada? Alguns comentários eram mais “sensatos” dizendo que o mesmo terminara com Maria em SotN, que tiveram uma filha e que a mesma seria a protagonista de Castlevania Bloodlines. Explicando assim porque a mesma utiliza a Alucard Spear.

Porém, ainda assim, é uma pequenice, algo tão singelo e ridiculamente normal, em uma série tão bem feita, que chega a ser risível o tamanho do descontentamento das pessoas. Mas é claro amigo, claro que a Netflix, esta empresa multi-milionária, irá sentir falta da sua assinatura de R$27,90 por mês. Horizon Zero Dawn e Castlevania estavam no limbo – principalmente o último, que estava mais morto que o próprio Conde Drácula. Por isto é hora de dar uma nova chama, permitir que novas histórias sejam criadas e contadas, com novas pessoas e novas identidades. E convenhamos, todo mundo sabe que o Alucard e vampirada se amarram em uma estaca no final das contas.