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Salvar o mundo é uma premissa presente em nove de dez histórias das últimas décadas. Na indústria dos jogos eletrônicos, essa façanha pode ser realizada por crianças, encanadores, ouriços azuis, robôs, soldados das forças especiais, gorilas, meninos vestidos de galo, assassinos. Todo mundo já teve uma chance. Em Addle Earth, a missão cabe a uma menina ruiva de raio laser, um macaco evoluído e um extraterrestre.

A criatividade do título da Sunland Estudios de Entretenimento Ltda se encerra na premissa e no exato momento em que o jogo começa. O que vem a seguir é um festival de ideias mal-executadas e um jogo que não me causava nenhuma vontade de avançar.

Bastion manda lembranças

De imediato, permita-me colocar logo na mesa o segundo mérito do jogo: narração dinâmica. A história é contada em um flashback, uma investigação conduzida para saber como o mundo foi salvo e de qual ameaça. Por causa disso, seus protagonistas explicam para o investigador o que aconteceu e reagem a algumas de suas ações na tela. Onde foi que já vimos esse conceito antes? Em Bastion, o jogo de estreia da Supergiant Games. O pessoal da Sunland nem tenta disfarçar a influência (já que seria impossível) e manda uma referência marota no começo da aventura.

Addle Earth
A vida nas alturas.

É uma pena que o recurso acaba se provando nem tão importante assim, quando não é inconveniente. São poucos os momentos em que o diálogo muda em virtude do que o jogador produz durante sua jornada. Em contrapartida, em determinadas sequências frenéticas, ou você presta atenção no que está sendo dito ou você presta atenção no que está fazendo, para evitar a morte certa.

Talvez a narrativa fosse mais prática ou agradável se a dublagem ajudasse. É preciso pontuar que Addle Earth, apesar de ser desenvolvido por um estúdio brasileiro, usando recursos conquistados junto à Ancine, não é dublado em Português. É uma decisão que soa estranha aos ouvidos nacionais.

Mais estranho ainda é o time de dubladores em inglês que leem suas falas com a monotonia de quem não sabe o que está fazendo. Essa deficiência beira o insuportável com Che, o macaco evoluído. Embora seja evidente que o inglês não é o idioma nativo do personagem, visto que ele é um símio, sua caracterização beira o caricato com um inglês que colocaria um sorriso no rosto de Joel Santana.

Addle Earth
Saída estratégica para passar um fax.

Bater ou morrer em Addle Earth

Os gráficos em Addle Earth oferecem uma visão isométrica do seu mundo, com uma falsa sensação de 3D. Visualmente falando, há jogos de celular no mercado mais interessantes. Se o objetivo era ser retrô, o resultado lembra vagamente a produção de títulos para PC do meio dos anos 90, com uma pegada de Dink Smallwood mas personagens mais cartunescos. Jogos como o também brasileiro Rogue Summoner nos provam que aparência não é tudo, mas isso costuma ser equilibrado com estilo ou mecânicas e nenhum dos dois é o forte de Addle Earth.

Os controles se atrapalham na hora de mover os personagens pelas paisagens, o que pode resultar em mortes inesperadas. Há um pequeno atraso em alguns comandos e a mira não é tão precisa quanto poderia ser. É possível que esses sejam defeitos facilmente corrigíveis ajustando parâmetros em seu código, mas outros problemas estão fortemente embutidos em seu conceito.

Addle Earth
A barca do Inferno!

Pega-se Che, por exemplo, um personagem com forte ataque de combate corpo a corpo, que sofre para conseguir impactar inimigos que fogem pelo mapa. Espera-se maior agilidade, nem que seja um pulo mais longo do macaco, mas ele tem a mesma movimentação de tanque dos demais protagonistas. Lutar com ele, então, se torna um exercício de sofrimento ou o abuso do seu ataque especial, que atinge uma área a média distância.

A jogabilidade não adiciona nenhuma novidade visível. Nem mesmo trocar de personagem é vantajoso ou obrigatório, como talvez pudesse acontecer em um Trine ou em um jogo Lego, uma vez que os personagens não possuem vantagens nativas ou habilidades realmente especiais que impactem o cenário. Há também pouca variedade de inimigos, robôs nada inspirados em sua concepção.

Para complicar a situação, há outros bugs desastrosos em Addle Earth. Em dado ponto, mesmo cumprindo todos os objetivos do mapa e levando meu personagem para o “ponto de extração”, o mapa seguinte não carregou. O protagonista sumiu e eu fiquei sozinho no mapa, segurando o cursor e esperando algo acontecer.

Addle Earth
Cadê o personagem? Ninguém sabe, ninguém viu!

O que está acontecendo?

Contornadas as dificuldades artificiais e os bugs, o jogo é curto. Gostaria de dizer que entendi como o mundo foi salvo dessa vez, mas misturar uma ruivinha, um macaco (mal) falante e um alienígena que parece o curupira no mesmo enredo se mostra um balaio de gatos confuso. Bem, está no título, então não é propaganda enganosa.

Sem nada de memorável para chamar de seu, Addle Earth é um tiro no escuro, uma aventura básica, genérica e tumultuada, tecnica e conceitualmente.

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