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Enquanto boa parte dos simuladores de corrida mainstream apostam em um pot-pourri de diferentes classes de carros e modalidades com um nível razoável de profundidade em cada um, a série F1 da Codemasters é uma das principais do mercado AAA a adotar um foco exclusivo, obviamente a Fórmula 1. Com um grau admirável de sucesso, a desenvolvedora capitalizou em cima da licença oficial do esporte e foi com os anos aprofundando seu jogo, algo que pode ser percebido principalmente a longo prazo, levando a F1 2020.

O mais novo game dá continuidade a esse avanço e oferece o pacote mais completo da série até hoje, mas com as mudanças de F1 2018 e apenas um ano depois do ainda mais expansivo F1 2019, pouco parece ter mudado. Isso é parcialmente verdadeiro, em especial, para o público hardcore (com ênfase no “parcialmente”), mas houve de fato outra grande expansão no caminho contrário, tornando este o título mais acessível de Fórmula 1, o que permitirá que uma nova leva de iniciantes pegue o jeito de seus sistemas e de seu excepcional modelo de condução.

Uma experiência familiar

Das interfaces às corridas em si, é válido dizer que F1 2020 está mais para um F1 2019.5, apesar de apresentar a lista original de circuitos da temporada 2020 (que hoje ocorre com um calendário limitado à Europa por causa da pandemia). À primeira vista, é possível confundir este jogo com o anterior, e à segunda vista também, já que tantos assets são reutilizados na engine EGO e não há alterações muito significativas de UI (interface de usuário). O tema da Fórmula 1 apenas nos lembra de que já vimos muito disso antes.

Imagem do jogo F1 2020
É feio apontar…

Uma diferença que dá pra realmente notar é a ausência de um fio narrativo nas horas iniciais de F1 2020. Mesmo sendo um aspecto um tanto inconsequente e que logo era deixado de lado pelo restante do game, em F1 2019 víamos alguns personagens introduzidos em cutscenes em primeira pessoa no período de Fórmula 2, tecendo a relação de rivalidade entre o protagonista e outro corredor, ambos fictícios. Aqui, não há sequer a tentativa de enfiar algum drama no meio, o que sinceramente não afeta tanto o resultado.

Isso pode limitar um pouco o gancho inicial com certos sistemas que retornam, como as entrevistas com a imprensa e a necessidade de criar rivalidade com algum outro corredor, mas não posso dizer que F1 2020 não introduz bem o jogador ao arroz com feijão da longa carreira, que assim como em 2019, abarca dez temporadas completas (ou encurtadas, se preferir) de Fórmula 1. O bom trabalho de localização para o nosso idioma deixa tudo mais prático, criando um contato mais próximo com o jogador através do rádio da equipe.

Novamente, a jornada começa já no finzinho da Fórmula 2, com um fim de semana que se encerra com a promoção de nosso corredor à Fórmula 1, podendo assinar contrato com a equipe de sua preferência – desde que tenha tido um bom desempenho, é claro. Chegando à F1, o jogador tem acesso ao QG da Equipe, que não difere muito de uma base de XCOM, com novas tecnologias a se desenvolver a partir de uma árvore, recursos financeiros para gerenciar e um calendário que usamos para avançar o tempo, tanto para acelerar a chegada de uma nova peça ou de um fim de semana de corrida.

Imagem do jogo F1 2020
O sistema de melhorias se baseia em risco e recompensa.

Na parte logística, não há muito em termos de imersão visual, mas isso não é necessário já que os sistemas estilo RPG são bem intuitivos e interessantes. Claro, o processo exige paciência já que cada peça leva muito tempo para ser desenvolvida, inclusive com boas chances de fracasso e regulamentos que mudam por temporada, e o retorno financeiro não é dos mais generosos de início. No entanto, responder as perguntas da imprensa com sabedoria pode melhorar desempenho de suas equipes de Pesquisa e Desenvolvimento e ganhar mais fama, então leve essas partes a sério.

O negócio fica divertido mesmo quando vamos à pista, tanto para os treinos livres quanto para classificação e corrida. É possível ter um gostinho de cada circuito correndo livremente, mas o recomendado é investir o tempo dos treinos executando os programas de treinamento especiais de sua equipe, a fim de coletar dados diversos de desempenho. Pode soar meio chato, mas é exatamente o oposto: cada programa se desenrola como uma espécie de minigame integrado ao circuito atual, criando mais oportunidades de melhorar seu desempenho e aprender ao mesmo tempo.

Quem tem pressa, contudo, pode simular quaisquer sessões de treino que preferir, porém coletando muitos menos recursos de produção do que receberia se fizesse os programas de treino, por exemplo. As qualificações, por sua vez, não podem ser simuladas, sendo cruciais para definir se o jogador ficará ou não com a pole position na corrida. Pessoalmente, recomendo que usem todo esse tempo disponível, até porque isso cria uma sensação rotineira que alavanca a imersão da experiência da F1, calcada no aperfeiçoamento dos tempos de volta e conhecimento das pistas.

Imagem do jogo F1 2020
Não deixe de executar os programas de treinamento.

Todos são bem-vindos

Nem todos vão encarar as corridas de F1 2020 em suas durações realistas, e a Codemasters oferece um leque de diferentes configurações, que vão do mais arcade (com um pequeno número de voltas por corrida sem paradas nos pit-stops) ao mais realista (com 90 minutos e passagens praticamente necessárias pelos boxes). Acrescentadas as inúmeras opções de acessibilidade, determinando ajudas adicionais no controle e a presença de efeitos físicos mais amenos no novo Modo Casual, tem pra todo mundo, algo que inclusive permitirá alguns fãs a jogarem com seus filhos.

Uma das principais novidades de F1 2020 é a adição do modo Minha Equipe, uma campanha secundária que adiciona uma nova camada de gerenciamento à estrutura de carreira solo. Neste modo, além de correr, você é incumbido de contratar patrocinadores, arriscar novas deals no mercado de pilotos para conseguir um bom parceiro de corrida e por fim controlar sua receita a fim de poder desenvolver o carro perfeito. A agenda da equipe também é definida pelo jogador, quase como uma espécie de puzzle de encaixar blocos já que algumas atividades tomam mais tempo do que outras no calendário.

Salvo por esses aspectos, Minha Equipe não é radicalmente diferente do que já vemos na carreira solo, sendo mais uma alternativa que os jogadores podem embarcar logo de início de acordo com suas preferências. Aliás, se você espera que controlar Michael Schumacher em Minha Equipe vá surtir alguma diferença, saiba que o jogo ainda se refere ao jogador como um “novato da F1 no comando de sua própria equipe” durante as cutscenes, gerando um estranhamento imediato. Schumacher é apenas uma skin cosmética, presente na edição Deluxe do jogo.

Imagem do jogo F1 2020
Uma realidade paralela onde Michael Schumacher não é famoso.

Em adição ao conteúdo solo, F1 2020 oferece os típicos eventos especiais com desafios por diferentes circuitos e carros (bem no estilo do que 2019 oferecia), multiplayer online com ligas e uma aba dedicada exclusivamente a eSports. Uma “novidade” legal é a volta da tela dividida, permitindo disputas multijogador locais, e aparentemente o desempenho do jogo neste modo está decente, até porque a experiência tem como principal pilar técnico sua performance a 60fps, algo que a EGO Engine tem se mostrado bastante propensa a entregar.

A fluidez da performance não vem sozinha, já que o alvo de 60fps não representou qualquer sacrifício visual notável. F1 2020 é um game lindo, especialmente se jogado em uma tela 4K com suporte ao HDR, alcançando um equilíbrio invejável entre fidelidade visual e otimização, com um método de anti-aliasing que resulta numa imagem limpa de serrilhados e ainda assim cristalina. Os efeitos climáticos, por sua vez, continuam a impressionar como poucos conseguem, sem sequer machucar o desempenho técnico (pelo menos no PS4 Pro).

Os belos visuais felizmente não entram no caminho do que mais importa em F1 2020: a sensação de jogá-lo. Com uma implementação fantástica da vibração do DualShock 4, tornando irresistível o ato de passar em cima daquela zebra de vez em quando, a Codemasters consegue novamente evocar o sentimento de estar no controle de uma supermáquina, capaz de curvas absurdamente precisas e disparando pelas chicanes sem perder velocidade. A resposta ágil dos controles torna isso tudo num prazer absoluto, principalmente nos dois novos (e excelentes) circuitos de Hanói e Zandvoort.

O circuito de Hanói é empolgante, principalmente na chuva.

F1 2020 pode parecer redundante para aqueles que já jogaram a edição de 2019, mas não dá para negar o capricho que a Codemasters coloca nesta série. Se você já possui a versão anterior, talvez a aquisição imediata não valha tanto a pena, mesmo com as atualizações espelhando a nova temporada de Fórmula 1 e a adição do Minha Equipe, mas com a expansão das opções de acessibilidade e um enorme volume de conteúdo, esta é a porta de entrada perfeita aos jogadores de primeira viagem, tanto os novatos quanto aqueles que querem ser desafiados.

Review – Unicorn Overlord

Renato Moura Jr.Renato Moura Jr.16/03/2024