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Nem só de JRPG vive o homem e qualquer surpresa indie é bem-vinda para nos fazer sair da zona de conforto entre Final Fantasy e Dragon Quest. Quando o assunto é RPG tático, melhor ainda! Mesmo sendo um estilo muito bem representado pela franquia Divinity e outros títulos de peso, como XCOM, sempre fico com a impressão de que poderia ser um subgênero mais explorado.

Há dois anos atrás a corajosa dupla do estúdio 6 Eyes apresentou seu projeto Fell Seal: Arbiter’s Mark para o mundo, o que não demorou muito para bater a meta no Kickstarter. Fortemente inspirado em Final Fantasy Tactics e Tactics Ogre, o jogo traz um RPG tático com um universo próprio e muito satisfatório, não muito diferente de tudo que já vimos mas definitivamente promissor.

Todo mundo quer ser imortal

No mundo de Fell Seal, uma grande fera trouxe ruína e calamidade sob a humanidade e todas as criaturas vivas. Misteriosamente, um grupo de guerreiros adquiriu poderes sobre-humanos e juntos foram capazes de destruir esse monstro. Esses guerreiros ficaram conhecidos como Imortais, pois como o nome já entrega, suas habilidades também lhe garantiram uma vida bem longa.

Após seu triunfo, os Imortais criaram um conselho para discutir as possíveis ameaças que podem instaurar o caos novamente e desse modo foram mantendo o mundo em paz por séculos. Quando um Imortal decidia abandonar seu posto, o mesmo deveria escolher um sucessor para mandar em uma peregrinação. Caso o pupilo cumprisse sua missão, ele se tornaria um Imortal e substituiria seu mestre no conselho.

O Dracula de Castlevania é um dos Imortais.

Como os Imortais não são onipresentes, eles encarregam várias outras pessoas de vigiarem o mundo e manter a ordem – estes que são chamados de Árbitros. Nossa protagonista é a Árbitra Kyrie, capitã do exército local que durante uma patrulha testemunha um nobre assassinando uma pessoa a sangue frio. Mal ela sabia que aquilo iria mudar a sua vida para sempre, dando início à nossa jornada.

Nesses três parágrafos que explicam o mais básico do enredo de Fell Seal já dá para notar que o universo do jogo é criativo, bem construído e com personagens interessantes. Mesmo que grande parte do que vemos ali não seja tão original e por vezes muito clichê, o título ainda possui bastante identidade própria e isso é um ponto bem positivo. E tem mais: ele está totalmente localizado em português, então ninguém vai passar sufoco durante suas longas cutscenes recheadas de diálogos!

O modo como o jogo funciona é totalmente inspirado em Final Fantasy Tactics – não importa se for a versão de PlayStation, PSP, GBA ou de celular, se você já jogou FFT, já conhece muita coisa de Fell Seal. Um detalhe legal é que a dificuldade é completamente customizável, então antes de começar a jogar você terá uma série de opções que pode alterar ao seu gosto, não só no quão forte serão os inimigos mas também na faixa de level das batalhas, nos equipamentos dos oponentes, no número de inimigos em cada luta e por aí vai.

Isso é TOTALMENTE Final Fantasy Tactics!

Nostalgia pura

Os únicos momentos de gameplay são durante as batalhas. Quando não estamos lutando, só nos resta assistir as cutscenes, que são apresentadas em diálogos com texto bem à moda antiga. Apesar do visual do jogo ser bem charmosinho, a animação de movimentos das personagens é fraca e limitada, não trazendo dinamismo às cenas, o que torna tudo por vezes meio monótono de se assistir. Ainda assim, não é algo que tira tanto o brilho do jogo.

Entre uma longa cutscene e outra somos jogados no mapa-múndi, onde podemos visitar lojas e guildas nos pontos que representam cidades e encarar batalhas nos outros pontos pela estrada. Cada pontinho é uma batalha diferente, alguns com alguma motivação que pode ser importante (ou não) para o enredo, enquanto outras são apenas contra inimigos banais, como criaturas selvagens que nos atacam. Independente do que for, os combates nunca serão rápidos, sempre levando pelo menos uns 10 minutos para serem concluídos, então este não é um jogo rápido e dinâmico que dá para avançar rapidinho – será necessário bastante paciência do jogador.

Sair na porrada com criaturas selvagens não pode faltar em RPGs táticos.

Além das personagens principais da sua party – aquelas que fazem parte do enredo – você também pode contratar mercenários nas guildas locais para lutar por você. Todos eles possuem classes mais genéricas e servem apenas como peões em batalhas, mas toda ajuda vale e você pode até customizar a aparência deles, o que é muito legal.

O modo de jogar é super intuitivo e até quem nunca jogou um RPG tático antes pega o jeito em instantes. Cada personagem possui seu turno de ação, no qual ele pode se locomover pelas células disponíveis (o que também é influenciado pelo relevo, mais uma cortesia de Final Fantasy Tactics), atacar um inimigo ou usar um item ou magia a seu favor. Assim como em FFT, a personagem ganha experiência por cada ação realizada e não no final de cada luta, então em quase todos os turnos você ganha XP e sobe de level no meio das batalhas.

Várias batalhas também apresentam condições especiais que exigem mais estratégia, como, por exemplo, manter uma personagem posicionada sobre um alçapão para impedir que reforços inimigos cheguem ou alcançar baús espalhados pelo campo de batalha para garantir um loot extra. Não basta ser estrategista apenas no combate, tudo em Fell Seal exige estratégia.

As batalhas têm até MVP!

A customização não para na dificuldade e nas personagens genéricas, também se expandindo para as classes das personagens principais. Cada uma dispõe de mais de uma classe, cabendo a você escolher qual te apetece mais e ir desbloqueando novas habilidades naquela classe conforme ganha mais levels. É tudo bem simples de entender, mas são tantas funcionalidades que pode até te deixar meio perdido no começo – nada que umas horinhas de jogo não te faça acostumar.

Para coroar esse conjunto de características mais que nostálgicas, a trilha sonora também não deixa a desejar, com músicas instrumentais e empolgantes que carregam muito das faixas de Final Fantasy Tactics. De alguma forma, as músicas também se encaixam perfeitamente com todos aqueles cenários desenhados a mão e repletos de cores vivas, o que torna o jogo bem agradável de se jogar.

Fell Seal: Arbiter’s Mark é uma surpresa das boas. Não dá para esperar muita coisa dele nos momentos iniciais, mas quanto mais se joga, mais difícil se torna parar de jogar. Com uma história surpreendentemente interessante e um gameplay muito divertido, todo amante de RPG tático deveria dar uma chance, afinal, falo com tranquilidade que é um dos melhores indies que joguei este ano.

Review – Unicorn Overlord

Renato Moura Jr.Renato Moura Jr.16/03/2024