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O elemento que fica mais evidente após o término de Final Fantasy XIII é a falta de coesão. Existem várias boas ideias aqui que diferem de seu JRPG comum, mas elas são todas abafadas pela necessidade de manter a tradição, sem nenhuma justificativa. Por causa disso, FF XIII é um jogo que constantemente se digladia entre conceitos que não se complementam, e acaba sendo uma experiência pobre, especialmente considerando o padrão a que viemos esperar da franquia.

Vamos antes de tudo tirar uma coisa do caminho. Visualmente existem poucas coisas que podem se equiparar a Final Fantasy XIII. Não apenas suas CGs, que em qualidade rivalizam com qualquer animação da Pixar, mas os detalhes dos personagens, monstros e efeitos dos ataques e magias são impressionantes do começo ao fim. No entanto, sua beleza consegue mantê-lo na experiência por tempo limitado, pois é evidente que as outras partes do jogo não receberam o mesmo cuidado.

A começar pela história, considerada por muitos o cerne de todo bom Final Fantasy. Ela se inicia propositalmente de maneira súbita, com fatores chave para a compreensão daquele mundo aparecendo nas conversas dos personagens, mas nenhuma explicação é dada ao jogador. O que é Cocoon? O que é Fal’Cie? O que é Pulse, o que é um l’cie? É fácil perceber com o decorrer da aventura que a decisão de colocá-lo no escuro para pouco a pouco esclarecê-lo foi uma cuidadosamente pensada. Uma vez que todas as cartas estão na sua mão e você compreende o universo de Final Fantasy XIII, é um pouco chocante ver como esses mistérios são na verdade bem simples e pouco criativos, todos costurados por uma trama mal escrita e raza. O mais estranho é que, mesmo não possuindo nenhum ponto complexo ou de difícil compreensão, existem algumas características desse mundo que não são expostas durante o jogo. Para vê-las é necessário ler algumas páginas da database, contida dentro do menu – solução no mínimo deselegante.

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Lado a lado à trama caminham seus personagens, que também vão se revelando de pouco em pouco. E, da mesma maneira que se dá com a história, não há muito a ser explorado aqui. Eles são todos bastante planos, e a maneira como seus problemas e dilemas são apresentados é mal executada, tornando difícil qualquer forma de empatia. Esse problema de execução é resultado direto da maneira como a história é contada, que sofre de uma cadência irregular e de uma má estruturação entre momentos de maior intensidade emocional, momentos mais brandos, momentos cômicos etc. Por causa disso, qualquer tipo de revelação pessoal, crise ou de determinação por parte dos personagens passam o sentimento de serem falsas no contexto em que aparecem, já que sempre surgem de maneira súbita, em horas não condizentes com o sentimento mostrado.

E é justamente em sua estrutura, um tanto mal construída, e a maneira como ela determina a narrativa, que os problemas de Final Fantasy XIII se tornam visíveis. Não vejo nada de errado com uma narrativa linear, mas o jogo em questão é meramente uma linha que não te oferece nenhum tipo de escolha, há sempre apenas um caminho a ser seguido. Por consequência, há um número específico de lutas que devem ser travadas (os inimigos podem ser vistos no mapa) e uma quantidade predeterminada de experiência, chamadas aqui de Crystarium Points, ou CP, que será obtida antes de um chefe. É verdade que os inimigos renascem depois de algum tempo, e enfrentá-los novamente garantiria um número maior de CP. No entanto, o sistema de evolução do jogo, um pouco similar ao de Final Fantasy X, limita os atributos e habilidades que você pode possuir em determinados capítulos da aventura, fazendo com que você nunca possa estar mais forte do que o necessário para uma luta.

Isso por si só não é um problema, mas causa uma sensação estranha. Por haver apenas um caminho a ser seguido, sem segredos a serem descobertos, o controle do jogador sobre os eventos parece mínimo – para não se dizer nulo. O jogo está sempre controlando quais personagens e habilidades você terá ao seu dispor em determinadas lutas, e tudo que você pode fazer é trabalhar com as ferramentas que lhe são dadas, que são de uso extremamente limitado. Para piorar, você é levado pela mão de forma muito vagarosa. Demora-se demais para que todas as mecânicas lhe sejam entregues; é só cerca de depois de 15 a 20 horas de campanha que você terá tudo ao seu dispor para então agir da maneira que quiser, o que resulta em 20 horas bastante tediosas.

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A liberdade pode ter sido retirada do jogador, mas em troca recebe-se o elemento mais bem construído e explorado da Final Fantasy XIII, o seu combate. Pelo fato de você ter um nível específico em todos os momentos, a força dos monstros é sempre equilibrada à sua, criando as lutas mais táticas que qualquer título principal da franquia já teve até hoje. A complexidade vem basicamente do malabarismo que se faz entre as diferentes classes, que funcionam mais ou menos como os “trabalhos” dos Final Fantasies das antigas. Você tem o Comando, que seria equivalente ao Guerreiro, enquanto o Ravager seria equivalente ao Mago Negro, e assim por diante. O mais interessante é que a maioria dos inimigos só são suscetíveis aos seus ataques quando sua barra de stager é preenchida, e cada uma das classes age nela de maneira diferente. O Saboteur e Ravager a enchem rapidamente, mas a consequência disso é que ela se esvai na mesma velocidade. O Comando, por outro lado, a preenche muito pouco com cada ataque, mas faz com que ela se reduza mais devagar. É criando um equilíbrio entre as classes, e trocando-as no meio da luta de acordo com as combinaçõesque você monta através do menu, que consegue-se ter sucesso ou derrota nos combates. Mudar sua tática pode ser o diferencial entre sofrer em uma luta durante dez minutos e entre ganhá-la sem problemas em apenas dois.

A troca não é exatamente justa, já que por mais interessante que o combate seja a monotonia do resto do jogo é mais forte. Mas isso vai passando de pouco em pouco. Como disse, lá pelas 20 horas as mecânicas começam a estar todas nas mãos do jogador, os personagens começam a resolver os seus dilemas e tomar iniciativa e a trama começa finalmente a ir para algum lugar. E é nessa hora que Final Fantasy XIII dá seu último tropeção, do qual não consegue mais se recuperar.

É mais ou menos nesse momento em que o jogo se abre pela primeira vez, aumentando significantemente a experiência que pode ser alocada aos seus personagens, permitindo que você os evolua em todas as classes e oferecendo missões secundárias. Acontece que é justamente aqui que ele também pega o que antes estava fazendo bem e joga fora. Primeiro de tudo, você não é preparado para identificar a força dos monstros que estão no seu caminho. Agora é possível evitar lutar com grande parte deles, mas por que você faria isso? Afinal de contas, até agora todas as lutas podiam ser vencidas, desde que você usasse uma boa tática. E o que acontece então é que existem vários inimigos que conseguem derrotá-lo com um único ataque; não importa quais táticas você use, agora é necessário que você mate monstros mais fracos até ter nível para enfrentá-los.

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Tendo já eliminado o aspecto tático do combate, que era o ponto mais positivo do jogo, chega a vez de trazer abaixo sua trama e seus personagens. A história parecia finalmente querer caminhar para algum lugar, mas aqui o roteiro perde qualquer coerência que possuía e se estagna. Os eventos principais se diluem em cenas sem importância nenhuma, que além de não contribuírem para nada retiram qualquer senso de progressão. O desenvolvimento de personagens, por sua vez, desvia-se do caminho que estava seguindo. Os protagonistas pareciam estar decididos sobre que ações tomar, mas qualquer falha no percurso faz com que eles caiam nos mesmos dilemas que já foram confrontados e solucionados anteriormente. Tudo isso para logo em seguida serem novamente resolvidos pelas palavras encorajadoras de algum outro membro do time, que se utiliza de todos os clichês que ele tem disponível. Essa volta aos dilemas acontece periodicamente com todos os personagens, todos eles sofrem os mesmos questionamentos, tudo para rapidamente terem sua determinação renovada. Isso faz com que suas personalidades se mesclem e fiquem muito parecidas, eliminando qualquer traço único que possuíam até então.

Creio que é desnecessário dizer o quão tedioso é o resultado disso. Sem mais ter a parte tática do combate o jogo perde o que tinha de interessante, e a história e seus personagens são muito precários para o sustentarem por si só. O tédio chega ao seu ápice nas últimas três horas, quando Final Fantasy XIII fica incrivelmente apelativo. Ele arremessa contra você uma grande quantidade de inimigos, em lutas que não são desafiadoras mas que demoram demais para terminarem. O único momento em que tive dificuldades foi no confronto contra o último chefe, no qual foi necessário ganhar CPs por cerca de uma hora até poder derrotá-lo, mesmo tendo chegado nele sem grandes problemas. A recompensa disso é um final previsível e sem graça; um dos menos inspirados que a série já viu.

Boa parte desse tédio poderia ser facilmente evitada se Final Fantasy XIII tivesse recebido uma boa edição. É verdade, muitos dos fãs mais ardorosos reclamariam se a aventura tivesse menos de 40 horas, mas não existe nada aqui que justifique essa duração. Ela é um exemplo de uma tradição que é repetida apenas por causa disso – por ser uma tradição. Se os eventos mais importantes acontecessem de maneira mais sucinta seria muito mais simples conseguir evitar olhar tão intensamente para as coisas que não dão certo, já que elas, quantitativamente, são as que mais estão presentes devido ao tempo que o jogo dura.

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Existem ainda mecânicas que em teoria aumentam a complexidade do jogo, mas que não foram muito bem pensadas. Por exemplo, todas as armas e acessórios podem ser melhorados, desde que você coloque neles itens que podem tanto ser ganhos em lutas como comprados. Você irá encontrar diversas armas durante a aventura e nenhuma delas é necessariamente melhor do que a outra; o diferencial vem dos efeitos inerentes a elas, como aumentar a potência das habilidades de cura ou melhorar a duração de magias que prejudicam inimigos. Enquanto o leque de escolhas é mais variado no início, passei a ignorar qualquer novo equipamento que encontrava em pontos mais tardios do jogo por uma simples razão. As armas que vinha usando desde então já estavam muito mais fortes do que qualquer coisa nova encontrada. A única maneira de tornar os achados úteis para o combate seria perder tempo matando monstros até conseguir itens o suficiente para aumentar seus níveis, eventualmente equiparando-os aos que eu utilizava – atividade ingrata e chata. O mesmo pode ser dito das classes dos personagens. Por que, depois de 20 horas de jogo quando elas são todas abertas, você começaria a investir nas que acabaram de se tornar disponíveis ao invés de melhorar ainda mais as classes nas quais eles já estão avançados?

Por último, existe um grande problema com os Sentinels. Os personagens que assumem essa função ficam na defensiva, atraindo a maior parte do dano a eles, garantindo que os outros personagens possam agir livremente. Acontece que muitos monstros, especialmente os maiores, possuem ataques de áreas. Em Final Fantasy XIII esses golpes não atingem automaticamente todos os alvos do time oposto. Ele age em uma área específica do campo de combate, e aqueles que estão por perto sofrem o dano. Por causa disso, a facilidade ou incrível dificuldade de algumas lutas dependem inteiramente de sorte. Não há como comandar o posicionamento dos seus combatentes. Assim, houve casos em que o Sentinel permaneceu ao lado dos outros dois membros do time, garantindo que os ataques de área sempre atingissem a todos, tornando nesses momentos inútil o uso da classe. Em outras ocasiões ele estava afastado dos outros personagens, fazendo com que o confronto fosse ridiculamente fácil.

Este é apenas mais um exemplo de como os vários elementos que formam Final Fantasy XIII estão desconexos. São várias partes de um todo que não conseguem se encaixar e formam um produto final repleto de contradições e ideias que se excluem. Isso não faz dele uma falha completa. Seu sistema de combate, por mais que não permaneça assim por toda a aventura, é interessante, e o visual do jogo é incrivelmente bonito. Entretanto, esses não são bons ou importantes o suficiente para esconderem os diversos problemas que permeiam esta nova produção da Square Enix. Mesmo se tratando de um dos principais títulos da empresa, ele não consegue ser relevante ao seu gênero, nem mesmo quando levamos em conta apenas a geração atual.

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