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Em inglês existe um termo chamado “high concept”. Dizer que uma obra possui um high concept significa que ela carrega uma ideia forte e fácil de ser explicada. Jurassic Park é sobre uma família presa em um parque onde os dinossauros voltaram à vida, Buffy é sobre uma adolescente que também protege o mundo lutando contra monstros das trevas, Portal é sobre uma arma capaz de abrir portais entre dois pontos do espaço.

Por sua vez Hello Neighbor traz uma abordagem diferente para o gênero stealth: ao invés de espionagem militar, ninjas e assassinos temos um ambiente suburbano visto pelos olhos de uma criança imaginativa. O seu vizinho está escondendo algo no porão e, sendo o pentelho que é, o jogador toma para si explorar a casa, abrindo passagens e encontrando itens, evitando que o dono o veja e comece a correr furiosamente em sua direção.

High concepts no geral são desejáveis porque são fáceis de vender; com poucas palavras (ou um trailer bem-feito) você captura a atenção de quase qualquer pessoa. Comercialmente eles são uma mina de ouro, mas no final das contas eles só representam uma proposta. Matrix não teria sido o que é se não fosse pelo talento enorme de um número absurdo de profissionais, independente do apelo que a sua proposta carrega.

Imagem do jogo Hello Neighbor
Quem sabe o que um cara com um bigode desses faria com uma criança bisbilhoteira?

Em 2015, quando Hello Neighbor foi primeiro apresentado ao mundo, o seu high concept fez dele uma sensação na internet, rendendo-o um lançamento pelo Steam Greenlight, uma campanha bem-sucedida no Kickstarter e um contrato com uma publisher grande. Mas apesar do conceito cativante e do visual charmoso, que evoca os filmes da Pixar mas ao mesmo tempo reforça uma sensação de que há algo sinistro acontecendo ali, os desenvolvedores falharam miseravelmente em desenvolver um jogo a partir disso.

Um passo em falso…

Mesmo tendo passado um tempo considerável em alpha, a falta de polimento do jogo é gritante. Um exemplo: no controle há três botões de interação, e é possível interagir com diferentes objetos de diferentes formas. O problema é que não é nem um pouco intuitivo qual botão faz ação X com objeto Y, nem fica claro quais ações são possíveis nesse contexto. É extremamente frustante quando você está fugindo do vizinho e precisa abrir uma porta rapidamente, ou está tentando ativar um mecanismo antes que ele te note, e o personagem realiza a ação oposta da que você deseja, fazendo você falhar sem piedade.

Imagem do jogo Hello Neighbor
Até a própria movimentação parece precisar de polimento, o que torna frustrante fugir do vizinho nos corredores estreitos da casa.

E o stealth em si não funciona bem. Você nunca possui informação o suficiente sobre o layout das fases (que é a casa mudando ao decorrer do jogo) e nem sobre rotas e armadilhas decididas pelo vizinho (de forma dinâmica, ele possui uma IA que se adapta às ações do jogador). Isso faz com que você dependa fundamentalmente de tentativa e erro, o que por si só já é um pecado, mas que com sucessivos encontros com o vizinho acaba roubando todo o senso de terror que o jogo inicialmente evoca.

Falando em tentativa e erro, deixe-me pontuar os puzzles. Para ter acesso às diferentes partes da casa é necessário realizar certas ações em ordem. Como não há indicação nenhuma sobre quais ações são essas eu deduzo que a intenção era que elas representassem quebra-cabeças, para atiçar a astúcia do jogador. Porém muitas vezes eles não fazem nenhum sentido com a lógica do mundo real, não há nenhum tipo de lógica interna desenvolvida ao decorrer do jogo (exceto por alguns motifes) e os objetos-chave raramente são bem indicados usando luz, posicionamento ou qualquer outro truque de design, o que me faz suspeitar que deveria haver um menu estilo Bethesda dizendo o que fazer em seguida, só esqueceram de implementá-lo.

Imagem do jogo Hello Neighbor
O que começa com uma casa simples evolui para um verdadeiro labirinto.

Toda essa bagunça de execução faz com que Hello Neighbor seja uma tortura de ser jogado. É uma pena, já que o high concept é incrível. Nos primeiros momentos jogando você é invadido por aquele senso de imaginação e curiosidade infantil, como se o porão do seu vizinho pudesse esconder literalmente qualquer coisa, por mais fantástico que seja. Mas passado tudo isso o que me restou foi imaginar que eu estava jogando um game melhor.

38%


Prós:

🔺 Proposta cativante
🔺 Visuais evocativos

Contras:

🔻 Puzzles mal-elaborados
🔻 Stealth não funciona
🔻 Falta de polimento absurda

Ficha Técnica:

Lançamento: 08/12/17
Desenvolvedora: Dynamic Pixels
Distribuidora: tinyBuild
Plataformas: PC, Xbox One
Testado no: PC

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