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Legrand Legacy é um JRPG indie, desenvolvido pela SEMISOFT da Indonésia, que partilha da mesma premissa que permeia a moda retrô que se iniciou com Braid em 2008: pegar ideias familiares e re-interpretá-las com as sensibilidades modernas do design de jogos. E isso, por si só, é uma ótima ideia. Mas o que torna essa ideia especial é a sua execução, o quão bem você consegue transferi-la para a cabeça do leitor/jogador/consumidor. E é essa mesma execução que separa Braid de Legrand Legacy.

É clara a paixão dos desenvolvedores por JRPGs desde o momento que o menu aparece na tela. A trilha suave nos prepara para uma épica aventura, cheia de mistérios, pessoas interessantes e tesouros, só esperando para serem descobertos. Ou pelo menos é isso que ela te faz pensar.

O problema da nostalgia

Nostalgia, como a maioria das coisas boas da vida, é uma faca de dois gumes. Quando usada corretamente, ela traz uma certa familiaridade instantânea para qualquer tipo de obra. Você não precisa saber muito bem como determinada coisa vai se desenrolar para já ter alguma certeza, lá no fundo, de que vai acabar sendo algo do seu agrado, só por ela partilhar certos elementos em comum com produtos que você aprecia. Stranger Things e Jogador Nº 1 são bons exemplos disso. Mas quando ela é usada sem profundidade, só para criar uma rápida conexão com o interlocutor, pode ser algo perigoso. Legrand Legacy usa a nostalgia muito bem. Tão bem, de fato, que o efeito nostálgico demora a se dissipar. Mas quando ela finalmente desaparece, o que resta são apenas pedaços desconexos porém cheios de potencial.

Imagem do jogo Legrand Legacy
As Arcanas (ataques especiais) com a câmera cinematográfica.

Os primeiros minutos de Legrand Legacy são tão bons, que você até releva o fato de que a primeira batalha do jogo – feita para ensinar as mecânicas de combate para o jogador – não pode ser vencida. Não importa o que você faça. Mesmo com o sistema de batalha enfatizando a habilidade do jogador, para maximizar a efetividade dos combatentes em campo. Assim que você seleciona uma ação, um quick time event surge na tela com um botão no meio de um círculo, e em volta dele gira um ponteiro, que deve ser parado no momento correto – pressionando o botão em destaque. Quanto mais preciso você for, mais efetivo seu ataque – ou sua defesa – vai ser. E mesmo assim essa luta está perdida, porque o roteiro diz que você precisa “morrer”. Se esse sistema de combate te lembrou de The Legend of Dragoon, você não está sozinho.

Imagem do jogo Legrand Legacy
A principal mecânica dos combates.

Gerenciamento de recursos

A qualidade dos modelos dos personagens principais por sua vez impressiona, e muito. É notável o nível de detalhamento dos personagens principais, e dos seus retratos nas caixas de diálogos, demonstrando que o time de designers realmente se importa com os personagens que os jogadores passarão a maior parte do tempo utilizando. No entanto, assim que você entra na primeira batalha fora da primeira cidade, fica claro que a maior parte do tempo de desenvolvimento foi destinada aos personagens principais. Os inimigos são tão genéricos e mal acabados que acabam destoando mais ainda com os demais personagens. Um exemplo disso são as harpias, um dos inimigos mais comuns no começo do jogo. Elas parecem com… sendo bem honesto, eu não sei nem explicar com o que elas parecem. E esse contraste de qualidade termina com qualquer imersão que o jogador possa ter tido até então.

Imagem do jogo Legrand Legacy
Os planos de fundo pré-renderizados realmente impressionam.

O estranho é que os planos de fundo – sem dúvida inspirados nos planos de fundos pré-renderizados da era do Playstation 1 – também receberam uma certa atenção, e algumas vistas acabam sendo realmente impressionantes, especialmente para uma equipe tão pequena. As animações dos personagens durante seus golpes especiais – chamados de Arcanas no jogo – também são impressionantes, mas também acabam contrastando com as habilidades normais, que muitas vezes param na metade do caminho, parecendo que não foram animadas completamente. Mesmo assim, tudo isso poderia ser relevado se ao menos a história e o desenvolvimento dos personagens fossem interessantes, porque no final das contas nós investimos horas nesse tipo de jogo para vermos nossos personagens se esforçarem, crescerem e evoluírem, juntamente com o mundo ao seu redor, sendo guiados por uma narrativa, pelo menos, competente, o que não é o caso.

Jonathan Blow, o criador do Braid, falou notoriamente durante as gravações de Indie Game The Movie que ele não sentiu que seu jogo conseguiu se conectar com a sua audiência da forma como ele esperava. Eu me pergunto, daqui a alguns anos, o que o time da SEMISOFT irá dizer sobre esse jogo, e se eles conseguiram atingir o objetivo que eles propuseram para si mesmos durante o desenvolvimento dele.

Imagem do jogo Legrand Legacy
A qualidade dos modelos demonstra o potencial do jogo.

Eu não me sentiria confortável em descrever Legrand Legacy como um jogo ruim, pois é clara a paixão dos seus criadores pelo gênero, e a sua vontade de continuar evoluindo-o. O potencial estava lá. Seja por falta de recursos, ou de tempo, as promessas que o jogo fez não puderam ser cumpridas, e às vezes é muito melhor o resultado ser um produto ruim, do que um produto genérico. Pois um produto genérico só prova que você tinha a inspiração, a paixão e as ideias, mas faltou a competência para executá-las de uma forma coerente e concreta.

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