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A série Metroid já sofreu anteriormente um baque em sua estrutura. Quando a Retro Studios se encarregou de dar continuidade às aventuras de Samus Aran, o estúdio optou por alterar completamente a perspectiva pela qual víamos o jogo, trocando a ação em 2D por um mundo tridimensional visto em primeira pessoa. Enquanto a mudança foi forte, a essência daquilo que faz de Metroid tão único e aproveitável – a cadência metódica da exploração, o anseio pela descoberta, a sensação de extrema solidão e de pouco a pouco sentir-se mais poderoso – foi mantida intacta, o que resultou na excelência da trilogia Prime. Essa parece ter sido também a intenção do Team Ninja. Dando pela primeira vez voz à heroína e um foco mais forte em elementos narrativos, além de optar pelo híbrido entre 2D, 3D e primeira pessoa, Metroid Other M quebra antigos paradigmas e caminha por territórios nunca antes explorados na franquia. O resultado, entretanto, não é nem de perto tão positivo quanto ao obtido pela Retro.

Other M começa da maneira como boa parte dos outros Metroids fizeram: com um chamado de socorro. Samus recebe um sinal de pedido de ajuda e segue em direção a Bottle Ship, palco no qual se dão todos os eventos do jogo. Uma vez no local ela encontra membros de uma patrulha da Federação Galática, entre os quais estão antigos companheiros com os quais a heroína teve um relacionamento próximo. Resolvendo seguir momentaneamente as ordens de Adam Malkovich, comandante da operação, Samus e os outros não demoram a perceber que algo bastante ruim aconteceu por ali, deixando quase todos os tripulantes da Bottle Ship mortos. Eles então se separam para descobrir exatamente o que se sucedeu, e é aqui que as coisas começam a ficar estranhas.

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Por ter decidido ficar sob o comando de Adam, Samus é impedida de usar seu equipamento, a não ser que receba uma autorização. Isso significa que, mesmo estando em posse de armas extremamente poderosas, você será obrigado a permanecer com as mais fracas, até que Adam resolva informá-lo pelo comunicador que pode utilizar outra coisa. No começo esse argumento apresenta certa lógica. No caso, é pedido especificamente que a caçadora de recompensas restrinja o uso de Power Bombs (as bombas mais poderosas soltas quando estamos na forma de bola), já que a potência delas poderia causar danos tanto à nave quanto aos outros membros da patrulha. No entanto, qual o sentido de não nos ser permitido usar o Grapple Beam (o gancho), por exemplo? Ou a habilidade de correr com grande velocidade? Nesses pontos o argumento é absolutamente ilógico e transparece como uma mecânica bastante mal executada de limitar inicialmente a abrangência de sua exploração. Essas situações ficam mais absurdas quando, por exemplo, você é obrigado a passar por uma área que provoca constantemente danos devido a altas temperaturas, já que ainda não lhe foi dada a autorização de ativar a Varia Suit. Só em um momento posterior, absolutamente arbitrário, que a ordem é dada, e você para de perder vida pelo calor.

Essa limitação acaba sendo a que dita toda sua exploração pela nave. Em mais de uma ocasião você deverá seguir até um ponto em que não há mais nada a se fazer para, assim que sair da sala em que estava, receber uma chamada pelo comunicador que o permitirá usar algum equipamento necessário para seguir em frente. Essa decisão de design em específico me deixou mais de uma vez coçando a cabeça, achando que eu é que não conseguia entender o que devia ser feito naquele ponto para poder ir em diante. Por que a comunicação não é feita exatamente no momento em que não é mais possível prosseguir foi algo incompreensível para mim por toda a aventura. O mais estranho é que, mesmo quando novos equipamentos são destravados, a exploração continua sendo artificialmente limitada. Diversas portas da nave, por razão nenhuma, ficarão fechadas por toda a duração do jogo, sendo que por trás delas estão locais que, quando eram acessíveis, continham upgrades, como mísseis e tanques de energia, que só podem ser alcançados com um equipamento adquirido posteriormente. A única maneira de chegar até esses locais é após os créditos terem rolado, quando é possível retornar a Bottle Ship e explorar todas as áreas livremente, como em qualquer outro Metroid.

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A aventura é permeada de narrações feitas por Samus, com ocasionais flashbacks que nos levam a eventos transcorridos durante sua juventude, quando ela mesma era integrante da Federação Galática. Essas descrições oferecem uma perspectiva nunca antes vista da caçadora de recompensas, pintando-a como uma garota frágil e insegura, que necessita fortemente do apoio de outros. Enquanto isso contrasta com a imagem da guerreira decidida e capaz que obtivemos através de todos os outros jogos da série, é possível aceitar esses fatos como algo pertencente ao passado, em uma época em que a heroína ainda era novata. O grande problema é que, por razões inexplicáveis, a personalidade fragilizada está presente na Samus de Metroid Other M, o que cria grandes inconsistências. Essa é a mesma Samus que, mesmo que desconsideremos a série Prime, já enfrentou Mother Brain duas vezes e derrotou os piratas do espaço, além de ter quase que extinto todos os Metroids, considerados, na mitologia, a raça mais nociva de todo o universo. Nesse ponto ela já é certamente uma guerreira com experiência de sobra, o que torna essa personalidade de mulher frágil uma completa descaracterização da personagem. Sem dúvidas, o maior absurdo está em uma passagem em que ela reencontra um de seus arqui-inimigos e paralisa de medo. A simples presença do pavor, em alguém que em sua mudez sempre foi definida como determinada e impassível, é inexplicável. O acontecimento toma proporções ainda mais bizarras quando levamos em conta que o antagonista em questão já foi derrotado por Samus pelo menos em outras duas ocasiões. Essa narrativa inconsistente sofre também pela atuação fraca da atriz responsável por dar voz à caçadora. A impressão que se tem é a de que ela está lendo o texto de um papel, sem ter muita ideia de contexto ou do que aquelas palavras querem dizer. É um trabalho bastante pobre e igualmente decepcionante por ter sido essa a estreia de Samus ao mundo da fala.

Enquanto tudo que teci até aqui foram comentários negativos, ainda nem comecei a falar sobre o aspecto que considero de pior execução em Metroid Other M: os controles. O jogo utiliza apenas um Wii Remote, segurado horizontalmente, dispensando o Nunchuk. Isso gera complicações por termos de constantemente navegar em ambientes 3D. Usar o D-pad para se movimentar em locais com profundidade é desconfortável, além de oferecer pouca precisão. Esse aspecto é remediado em parte por uma esquiva que é feita automaticamente. Não é necessário apertar nenhum botão; desde que você esteja se mexendo em qualquer direção que não seja em cheio ao ataque inimigo, Samus irá desviar, colocando-o fora do caminho do perigo. Há apenas um porém pois, por se tratar de algo automático, é difícil conseguir perceber quais foram as diferenças de suas ações entre uma esquiva com sucesso ou uma falha. A natureza simplista do controle também faz com que os disparos de Samus mirem automaticamente nos inimigos que estão mais próximos. A mecânica funciona bem na maior parte das vezes, mas em ocasiões seus tiros serão direcionados a locais não desejados.

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A esquiva e a mira automática podem apresentar deslizes, mas são na maior parte do tempo funcionais e não devem causar incômodo. Meu problema é com as concessões necessárias para se ter uma boa jogabilidade que utilize exclusivamente o Wii Remote. Não existe nenhuma razão para que o Nunchuk não fosse implementado, e com ele seria trazida uma movimentação melhor e um botão dedicado para a esquiva. Isso aumentaria a precisão dos movimentos e diminuiria a sensação constante de que Other M está “se jogando” para você. Da maneira como os controles são não há finesse, você apenas corre e aponta em direções gerais e o jogo toma conta do resto. Mas, se isso fosse tudo, seria possível passar por esse novo Metroid sem grandes frustrações no quesito jogabilidade, aceitando-a em sua esquisitice – infelizmente, esse não é o caso.

Um aspecto crucial para o combate é a troca para a visão em primeira pessoa, única maneira que Samus pode soltar mísseis e suas variantes, e essa mecânica nunca funciona direito. Como você deve tirar o controle da posição horizontal e apontá-lo para a tela para que a perspectiva mude, existe um tempo necessário para que você se ajuste e veja em que local da tela a mira está aparecendo. Esse ato por si só já convida uma série de possíveis inconvenientes, especialmente se, dependendo da hora do dia, a iluminação interferir com os sensores do Wii Remote. Essa configuração apresenta um estranho contraste com o resto da jogabilidade, que é ágil, rápida e precisa – marca do Team Ninja. O ato de mirar, levando em consideração todo o movimento físico necessário mais o tempo de reajuste, é vagaroso, e não combina bem com o resto da ação. Mais do que isso, a mecânica pede que novas concessões sejam feitas, e essas com resultados ainda menos positivos do que os anteriores. Todos os chefes do jogo – e boa parte dos inimigos – tem uma pausa arbitrária, em que param de atacar e, às vezes, de se movimentar. Esse intervalo é sempre a deixa para que você entre na primeira pessoa e atire mísseis naquilo contra o que está lutando. Por causa disso, as lutas se tornam repetitivas, uma vez que sua estratégia é quase sempre a mesma. Mas o pior é que mesmo com essa pausa alguns problemas ocasionais surgem, em boa parte devido aos inconvenientes que podem aparecer com os sensores do Wii Remote.

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Se a pessoa que jogar Other M terá de fechar os olhos muitas vezes para tirar algum proveito do jogo, alguém que estiver apenas o assistindo certamente achará a experiência incrível. O visual de Other M, com exceção dos modelos humanos, é rico e bonito. A Bottle Ship possui diversos compartimentos que funcionam como um holodeck, podendo simular ambientes de outros planetas. Por causa disso, mesmo estando confinado dentro de uma nave, você verá locais variados, passando por diferentes vegetações, neve e até mesmo um vulcão. No entanto, mesmo os corredores mais simples têm muitos detalhes, e caracterizam bem a estação. Também vale ressaltar a beleza da armadura de Samus, com atenção especial ao seu brilho e aos efeitos de reflexão. Ainda assim, esteticamente a coisa mais impressionante é a velocidade e fluidez da ação. A caçadora de recompensas é acrobática e ágil, executando com destreza saltos e golpes impressionantes de se ver. Metroid Other M coloca pela primeira vez na série elementos de combate corpo a corpo, que normalmente funcionam como ataques de finalização. Quando um inimigo está caído, é preciso apenas correr em sua direção com um tiro carregado para que Samus realize automaticamente uma animação que o eliminará. A velocidade e precisão desses atos dão um ar de grande habilidade à heroína, o que, até que os elementos de história apareçam, farão você enxergá-la como a personagem dos jogos antigos, que tanto agradava. Os agarrões acontecem com uma inércia que convence do peso dos monstros segurados por Samus, criando uma sensação mais visceral no combate.

Ver Metroid Other M pode ser ótimo, mas um jogo precisa ser avaliado pela experiência de ser jogado, e não assistido. E, nesse fator, ele não apresenta pontos que o redimam. A jogabilidade desconfortável, imprecisa e extremamente facilitada seria, por si só, suficiente para fazer de Other M não recomendável. Entretanto, some-se a isso a completa descaracterização feita com a personagem Samus, acoplada a uma narrativa fraca e desnecessária, uma atuação incompetente e a exploração limitada, e você tem um jogo que deverá agradar somente aqueles que se consideram fãs fervorosos, que se derretem com a simples menção da palavra “Zebes”. Metroid Other M não é apenas o pior capítulo a ter aparecido na franquia, como é também, por si só, um jogo de má qualidade.

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