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TASOMACHI: Behind the Twilight em momento algum nega sua origem. O título é um sonho do designer nocras, veterano da indústria que já trabalhou em projetos belíssimos, como Legend of Zelda: Breath of the Wild. Seu talento transparece em cada pixel de seu jogo de estreia como desenvolvedor independente: é um colírio para os olhos, uma viagem esplendorosa por cidades de fantasia inspiradas na arquitetura japonesa.

Por outro lado, é inevitável constatar que a experiência vai muito pouco além de sua superfície. Apesar de exuberante e divertido, há falhas graves no jogo, entre elas a sensação de que o potencial foi desperdiçado e ele poderia ser muito mais do que ele é.

Enredo… quem precisa de enredo?

Em um mundo steampunk, a jovem Yukumo navega em seu pequeno balão. Ao cruzar por uma determinada ravina atravessada por um rio, sua aeronave sofre uma pane e ela é obrigada pousar na vila mais próxima. O local é habitado por gatinhos humanoides, os Nezu, que atuam como serviçais dos humanos que construíram cidades na região. Misteriosamente, seus mestres humanos desapareceram e uma estranha neblina cobre as cidades, ocultando a luz do Sol.

TASOMACHI: Behind the Twilight
Depois que inventaram o Japão, nunca mais floresceu cerejeira em nenhum outro lugar.

Esses eventos, assim como a pane na aeronave, parecem estar relacionados. Infelizmente, a trama central é apenas um pretexto para mover a personagem em uma constante exploração. Não há qualquer evolução em seu enredo ou mesmo respostas. Cada uma das cidades pode se ver livre da influência da névoa se Yukumo recuperar Recursos da Terra, lanternas douradas que se escondem no cenário, resolver puzzles nos templos sagrados e reativar as árvores místicas que ali se encontram. Essa mesma premissa irá se repetir várias vezes, sem se alterar um milímetro.

Desta forma, o contexto é uma camada lógica para que o jogador tenha o mínimo de motivação possível para esmiuçar os fascinantes ambientes. Não se pode culpar nocras por querer que nós nos percamos por essas vielas, passarelas, pontes, canais e casas de arquitetura exuberante. É evidente que seu criador colocou seu coração na construção desses ambientes. Seria uma pena se o jogador simplesmente atravessasse de forma rápida e linear esses locais pulsantes de vida.

TASOMACHI: Behind the Twilight
Shadow of the Colossus?!

Então, não há canto que não seja visitado e revisitado, não há visão panorâmica que não seja contemplada, até por causa dos saltos necessários para se obter os Recursos da Terra mais inacessíveis. Tudo contribui para que o jogador se detenha na poesia urbana que é TASOMACHI: Behind the Twilight e absorva essa experiência. Não há marcadores de tempo de espécie alguma, não há pontos de vida, nem inimigos.

É só isso mesmo

Ao coletar determinado número de Recursos de Terra, você tem acesso a um novo templo ou toda uma nova cidade. O mecanismo de recompensa porém se esgota rapidamente, a partir do instante que a conclusão do jogo é frouxa. No último nível, todas as mecânicas que havíamos aprendido até então são deixadas de lado em prol de uma jogabilidade insossa. Quem espera levar suas habilidades ao limite no final, sairá decepcionado. Quem espera explicações ou mesmo uma cutscene de encerramento, também sairá decepcionado. Ao eliminar o problema, o jogador fica com a sensação de não ter entendido o que aconteceu, é recepcionado com duas linhas de diálogo de agradecimento e um grande THE END com fundo preto.

TASOMACHI: Behind the Twilight
Sim, plataformas que flutuam. Achou que seria fácil?

Como TASOMACHI: Behind the Twilight se trata de um jogo de colecionar itens, obviamente ele não acaba quando termina. Devolvido ao ambiente, o jogador tem acesso a uma nova habilidade e pode tentar obter ainda mais Recursos da Terra, antes bloqueados. Com uma nova meta surpresa aparecendo, acreditei na possibilidade de existir um “final verdadeiro”.

Para a conclusão, com direito a Conquista no Steam, bastavam 150 objetos. Para liberar o conteúdo secreto, seria necessário atingir 180. Parti para o desafio, refazendo puzzles em busca de peças escondidas, esquadrinhando as cidades novamente, percebendo que novas quests surgiram. Não posso dizer que foi difícil alcançar o que o jogo pedia, porém novamente o prêmio não poderia ser mais frustrante.

TASOMACHI: Behind the Twilight
Ponto de partida.

TASOMACHI: Behind the Twilight traz apenas três cidades completas. Embora elas sejam de tamanho satisfatório, a vontade que temos é que haja mais lugares para se explorar, de tão convidativas que as cidades são, de tão prazeroso que é passear por seus caminhos. Então, é possível calcular minha decepção ao descobrir que as 180 lanternas douradas desbloqueiam apenas uma loja secreta de souvenirs para decorar um refúgio que você raramente visita.

Simpatia é quase amor em TASOMACHI: Behind the Twilight

A primeira impressão definitivamente é a que fica e a nota do jogo não poderia jamais ficar abaixo do que está. Seria até mais fácil trocar essa review por um grande álbum de viagem com os melhores momentos de seu universo. Certa vez, eu li que uma análise deveria ser mais próxima de um guia de turismo do que de uma análise fria. Tomei essa comparação como lema, porque não estamos analisando peças de plástico e metal, jogos não são um produto, mas uma experiência. Essa experiência, é claro, pode variar de indivíduo para indivíduo, porém cabe ao responsável por uma review contar como foi sua “viagem” por aquele mundo.

TASOMACHI: Behind the Twilight
Voar, voar, subir, subir.

Dito isso, minha viagem por TASOMACHI: Behind the Twilight foi uma coleção de cartões postais. Além de Breath of the Wild, nocra trabalhou como artista em Final Fantasy XIII-2, Final Fantasy XIV: A Realm Reborn e Xenoblade Chronicles 2 e toda sua sensibilidade estética se manifesta aqui, livre de qualquer interferência corporativa. Esse é o verdadeiro foco do jogo e todo o resto é colocado em segundo plano, para o bem ou para o mal.

Não é por acaso, então, que o jogo traga um modo foto caprichado. Além disso, a própria disposição das cidades, sua verticalidade evidente, apresenta pontos elevados que foram pensados para o jogador escalar, admirar a paisagem e fazer um registro. Fui, definitivamente, um turista vagando por pontos majestosos.

O jogo também se propõe uma experiência leve. A ausência de inimigos e a simplicidade com que a “ameaça” da trama é contornada libertam o jogador para simplesmente perambular por aí. Os Nezu são extremamente fofos, com suas roupinhas e seus gestos exagerados. A própria Yukumo também cativa, com uma inocência sublime e roupas desbloqueáveis de muito luxo.

TASOMACHI: Behind the Twilight
ahahahaAHAHAaha… eu vou roubar TUDO!

Esse balão podia voar mais alto

Apesar dessas qualidades, TASOMACHI: Behind the Twilight demonstra que nocra precisa se cercar de uma infraestrutura. Exceto pela trilha sonora assinada por Ujico*, todo o resto do jogo parece amador ou com pouco polimento. É possível encontrar mecânicas de salto que não são tão precisas quanto poderiam ser, uma história que não vai a lugar algum e sons ambientes muito abafados, como os passos da protagonista em diferentes superfícies. Um pouco de otimização também cairia bem, uma vez que os belos gráficos do jogo consomem um bocado de recursos da GPU sem necessidade e não há possibilidade de ajustes finos nas configurações.

Até mesmo a trilha sonora é problemática. Ainda que Ujico* (o asterisco faz parte do nome artístico) seja um compositor de evidente qualidade, é questionável se todas as suas faixas se encaixam na proposta do jogo. Algumas das músicas parecem perfeitas para relaxar no sofá em um lounge de uma danceteria moderninha, mas soam deslocadas em momentos de plataforma ou mesmo explorando a cidade.

Como chegar lá?

O ciclo de jogabilidade de TASOMACHI: Behind the Twilight é repetido em cada um dos cenários, com as mesmas falas, as mesmas metas e só não se torna cansativo porque a paisagem instiga. Porém, o jogo não deixa de ser repetitivo, com sua estrutura exposta sem disfarces.

Com 182 Recursos da Terra, eu continuei mais um pouco, desejando que houvesse mais: mais cidades, mais roupas, mais colecionáveis, mais respostas, mais diálogos. É um atestado do charme do jogo, mas também sua falha mais grave.

Review – Unicorn Overlord

Renato Moura Jr.Renato Moura Jr.16/03/2024