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Desde que Star Wars Battlefront 2 lançou infestado de microtransações que afetavam o equilíbrio da jogatina, o tópico raramente passou despercebido pela mídia especializada e os demais jogadores. Agora, em um ano repleto de games problemáticos no formato live-service, entre eles Anthem e Wolfenstein: Youngblood, Ghost Recon: Breakpoint chega como mais um título AAA a apostar nesta tática gananciosa. Porém, deve-se ressaltar que, como jogo, está muito acima dos dois títulos aos quais passou a ser comparado nesta semana.

Este será um review dos mais complicados, já que um detalhe não anula o outro. Pessoalmente, vejo boa parte das notas baixas – as muito baixas mesmo – de Ghost Recon: Breakpoint como uma iniciativa de combate a táticas monetárias que deveriam há muito tempo ter deixado de existir no mercado AAA, e considero isso totalmente compreensível como estratégia da imprensa de games e dos próprios jogadores. Por outro lado, não acho que se deve ignorar o trabalho de todos seus artistas, e por isso apontarei também diversos positivos do game.

Mundo 2.0

Começando pelos positivos, Breakpoint conta com um dos mapas de mundo aberto mais interessantes que a Ubisoft criou em um bom tempo. Talvez seja o aspecto do game onde uma identidade esteja melhor estabelecida, trazendo a ambientação no Mundo 2.0 / Auroa, uma ilha utópica e totalmente eco-sustentável administrada pela corporação Skell Technology. O local, repleto de drones e edifícios futuristas, agora está sob controle do mercenário Cole D. Walker (Jon Bernthal), que oprime seus habitantes enquanto busca… bom, isso é um mistério.

Imagem do jogo Ghost Recon: Breakpoint
Campo de guerra ou colônia de férias idílica?

É bem bacana notar como, além dos ambientes externos variados e bastante detalhados que estabelecem a Ubisoft Paris como referência na criação de topografia virtual, os locais internos agora são também muito maiores do que eram em Wildlands e naturalmente incorporados ao restante do mapa, tornando a invasão de certos prédios e complexos mais empolgante. Alguns detalhes específicos podem se repetir de vez em quando, mas no geral, estes ambientes são coerentes com suas funções na história deste mundo e o gameplay.

Já as animações se mostram mais sofisticadas do que no game anterior, que tinha movimentos mais duros e um leque de ações mais limitado no que tange a interação com cenários. Aqui, além da câmera que se encontra muito mais próxima do personagem Nomad durante combate e stealth, criando tensão e incerteza, seus movimentos ganham mais peso na mesma medida que parecem mais orgânicos, como por exemplo a sutil maneira como a câmera oscila quando corre, a animação de entrar em cobertura ou o deslizamento em solo íngreme.

Mecânicas de tiro e combate no geral são outra melhoria visível, unindo uma maior verossimilhança na maneira como armas dão recuo ou tiros atingem inimigos através de paredes fracas, e acertar headshots está mais satisfatório do que nunca. Vale dizer que, se inicialmente aparenta dura, a mira torna-se um costume depois de uma ou duas horas e que mesmo em situações de grande pressão de grupos de inimigos, a perspicácia do jogador é valorizada e pode resolver tudo. A direção de veículos, por sua vez, ainda é um gosto adquirido. Apenas a aderência à cobertura continua um tanto teimosa.

Onde há fumaça, há bivaque.

Agora, um grande upgrade de Ghost Recon: Breakpoint, não só em relação ao capítulo anterior mas aos games da Ubisoft em geral, é a maneira como se lida com a viagem rápida através do mundo. Os pontos de fast travel, aqui chamados de bivaques, não são os meros viewpoints de Assassin’s Creed mais, e as formas como podem ser descobertos variam bastante. É possível descobrir um bivaque a quilômetros de distância com seu drone, e logo viajar diretamente para ele, sem ter de ativá-lo presencialmente. Um alívio, a não ser que queira cheirar cada rosa no caminho – quer dizer, você ainda pode fazer isso.

O mesmo vale para aqueles bivaques que descobrimos através de arquivos ou NPCs no cenário, tornando estes colecionáveis muito mais úteis do que eram em Wildlands. Esta decisão da Ubisoft Paris tira grande parte do peso da experiência, em um bom sentido, já que torna o progresso pela campanha e missões secundários muito mais direto. Não que seja um sofrimento atravessar o mapa a pé ou com veículos, mas considerando as dificuldades no caminho, sejam montanhas íngremes ou inimigos mais fortes, são dores de cabeça a menos. Aliás, há muito menos grind aqui do que em Odyssey.

Outro toque muito acertado para o mundo aberto está na maneira como o stealth é incorporado a ele. Além das patrulhas de inimigos, de vez em quando drones e helicópteros sobrevoam o mapa e, nestes momentos, o jogador deve assumir a posição de prona e se camuflar com o que quer o solo seja feito, como terra, neve ou lama. Caso não faça isso, provavelmente será avistado e passará a ser caçado pelos Wolves, força de elite que é a mais letal da ilha, e assim uma trilha a la Sicario começa a tocar. Em geral, isto acrescenta uma boa dose de tensão em meio à exploração.

Imagem do jogo Ghost Recon: Breakpoint
Fazendo cara de paisagem pro drone não me perceber.

Largados e fritados

Como esperado, nem tudo são flores, embora haja muitas delas em Auroa. Os ditos elementos de sobrevivência, prometidos nas primeiras divulgações do game em conferências, são no máximo rasos. A energia vital do jogador consiste de três barras, e cada uma delas suporta um máximo de dano até ser perdida permanentemente. Para recuperá-la, o jogador deve cuidar de seus ferimentos corporais, em uma animação lenta e automática de Nomad aplicando curativos em diversas partes do corpo. O sistema de fadiga, então, passa quase batido com sua necessidade de tomar água para se recuperar da exaustão.

Um problema muito mais grave, no entanto, está em como certas missões da campanha de Ghost Recon: Breakpoint são estruturadas, mesmo que estejam minoria. Uma das piores envolve o resgate da cientista Paula Madeira em um complexo repleto de inimigos humanos e drones, e apesar de contar com checkpoints para cada uma de suas etapas, há um detalhe incomum: caso o jogador falhe e recarregue no checkpoint, todos os inimigos que matou cuidadosamente no complexo estarão vivos novamente, criando um desequilíbrio para a etapa final cronometrada.

Então ali estava eu, voltando ao checkpoint, alertando todos propositalmente e me assentando no mesmo fim de corredor, metralhando as dezenas de soldados que vinham às cegas para minha direção. Porém ainda assim restavam drones resistentes, e caso já tivesse ativado a etapa final antes de cuidar de todas estas pestes, teria apenas 14 minutos para dar cabo deles, de novos inimigos que surgem e ainda levar a cientista para outro canto distante do mapa. Uma vez, esqueci de desativar um único morteiro e, já no helicóptero da fuga, eu e a cientista fomos pros ares. Mas felizmente passou.

Perdi a conta de quantas vezes limpei esse corredor.

Esta missão é a síntese de como Ghost Recon: Breakpoint pode apresentar contratempos imprevisíveis, e não necessariamente bons à sua proposta. Pode ser frustrante passar uma boa meia hora eliminando inimigos com cuidado e planejamento, para depois ter a sensação de tempo perdido por conta de uma estrutura de checkpoints bizarra ou mesmo bugs ínfimos. Lembro de outra ocasião em que, ao interagir com um computador para encontrar o próximo passo da missão, Nomad travou nesta animação e só me restou reiniciar o game.

Mais outro elemento questionável é a presença de loot neste título. Fora por agregarem em números a um nível total de poder, como ocorria em Destiny, são apenas isso: números. No entanto, além disso, como o combate realista permite que se mate inimigos com headshots únicos e alguns disparos sucessivos de qualquer arma, a divisão dos armamentos em níveis me parece obsoleta. Nem mesmo drones, que são mais cascudos e talvez sejam o motivo para melhorar estatísticas, precisam de tanto poder de fogo para cair, apenas os tanques Behemoth, que por sua vez podem ser facilmente esquivados.

O desconto é maior se não comprar

Agora, ao x da questão: as microtransações. Como o nível de equipamentos já não importa tanto assim e o jogador pode encontrar nova loot a cada cinco minutos, por quê alguém pagaria por este mesmo equipamento na loja virtual? Por mais irônico que isso soe, a total falta de impacto das microtransações sobre o jogo, que ainda balanceia níveis no modo multiplayer PvP – o qual não testei por questões de tempo e disponibilidade -, as torna mais absurdas ainda. Ou seja, estão lá para atiçar jogadores que, na crença de que vão adquirir algo essencial, estarão apenas jogando seu dinheiro suado fora.

Quem pagaria 120 reais por algo que duas horas de jogo te garantem?

Ainda assim, Ghost Recon: Breakpoint sofre mais com sua indecisão. Há elementos leves de RPG, como histórias secundárias e escolhas de diálogo, outros de looter-shooter, como aqueles mencionados acima, e ainda uma tentativa muito frustrada de adventure, com soluções para “investigações” que necessitam de nada mais que o simples apertar do botão X. Não é sentido em nenhum momento que nada dessas coisas possui alguma consequência, e independente disso não haveria como ignorar a mediocridade com que são implementadas no pacote.

De resto, na parte visual, Ghost Recon: Breakpoint é exatamente o que se espera da Ubisoft a este ponto. Com exceção daqueles bugs pontuais, é um título AAA de mão cheia em quesitos gráficos, inclusive com opções entre favorecer resolução ou fidelidade gráfica no PS4 Pro. A engine Anvil Next mais uma vez se mostra flexível ao criar horizontes convincentes, vegetação densa e variada, além de entregar uma boa performance que quase nunca erra a marca dos trinta quadros por segundo. Algumas texturas continuam não tão convincentes, como paredes rochosas, mas é um salto.

Quanto ao departamento sonoro, a Ubisoft Paris certamente aprendeu com a Massive e criou sons muito mais reais para cada uma das armas, algo que havia decepcionado em Wildlands. Detalhes como passos em diferentes terrenos ou o ronco discreto do motor de veículos eco-sustentáveis também são agradáveis, assim como a mixagem acerta em cheio na espacialidade – o que ajuda a identificar ameaças não-vistas antecipadamente. A trilha musical, por fim, casa muito bem com a proposta de ação tática em contexto futurista. Só estranhei a incapacidade de habilitar o áudio em português, mesmo tendo baixado o pacote de expansão.

Imagem do jogo Ghost Recon: Breakpoint
Esta não é uma still de Death Stranding.

Por fim, ainda assim consegui apreciar meu tempo com Ghost Recon: Breakpoint. Apesar de não reinventar quase nada, invadir locais com estratégias diferentes sempre me manteve instigado, e é um bom título para se pegar e jogar de forma casual. Mas falo isso como alguém que não tem vínculo forte com os demais títulos passados de Ghost Recon, e sei ao certo que este não é o exemplar que fãs mais fervorosos da franquia devem realmente desejar. De qualquer forma, há diversos bons momentos de ação tática aqui para suprir parte dessa insatisfação.

Portanto, colocando de lado as questões mais insidiosas que Breakpoint traz consigo – e microtransações devem ser levadas a sério -, temos um game que, longe de ser excepcional e com trabalho a ser feito pela frente, pelo menos já garante horas e horas de ação competente em um mundo aberto que salta aos olhos. Sua história, que mal mencionei aqui, é cafona à mesma medida que ambiciona novas temáticas, mas isso é dificilmente o que os jogadores procuram aqui. Como nas missões encarregadas a Nomad, cabe a cada um avaliar as vantagens e desvantagens de embarcar em Ghost Recon: Breakpoint.

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